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Fragmentos da História Rio-clarense

O Início do Povoamento - Séculos XVIII e XIX

Este artigo é o primeiro de uma série de quatro, resgatando a história da cidade de Rio Claro, no mês de seu aniversário. Ele toma como ponto de partida o início do processo de ocupação das terras do “Sertão do Morro Azul”.

Essas terras ocupavam uma extensa área inexplorada e desabitada, situada no interior da Capitania de São Paulo, servindo apenas de passagem para aventureiros que penetravam o sertão. O seu processo de ocupação tem inicio no século XVIII, no ano de 1718, com a descoberta de ouro na região de Mato Grosso.

A posição geográfica favorável estimulou a formação de uma pequena povoação próxima às margens de um córrego. Sua população composta por alguns índios, pequenos agricultores e alguns escravos, praticava uma agricultura de subsistência. O local passou a servir de pouso e de suporte para os tropeiros, antes da subida da serra, estimulando o desenvolvimento de um pequeno comércio de gêneros de primeira necessidade.

O declínio da exploração do ouro refletiu na povoação que permaneceu por quase um século, apenas um pouso às margens do Córrego da Servidão.

Somente no início do século XIX, as primeiras sesmarias passaram a ser doadas na região. Estas eram porções de terra concedidas gratuitamente pelo vice-rei ou pelo governador a pessoas ricas e politicamente influentes. As doações que se sucederam, deram início ao processo efetivo de colonização, sendo a primeira sesmaria concedida em 17 de abril de 1821, aos irmãos Pereira. Estes obtiveram do Governador uma légua e meia de terras, no lugar denominado “Ribeirão Claro”, entre a vila de Moji-Mirim e o Rio Piracicaba. Esta sesmaria ficou conhecida como o Curral dos Pereira, sendo a mais antiga fazenda estabelecida no Município de Rio Claro.

As doações impulsionaram o processo de especulação das terras, trazendo para a região, além dos irmãos Pereira, Manoel Pais de Arruda, de Itu; Joaquim Galvão de França e Manoel de Barros Ferraz de Piracicaba e Francisco da Costa Alves de Jundiaí. Estes passaram a ser proprietários de grandes extensões de terras.

O Censo de 1822 nos dá idéia da organização do povoado, registrando cerca de 1033 pessoas sendo 85% da população livre e branca além de pardos e negros. Praticava-se uma agricultura de subsistência, plantando milho, feijão, arroz e mandioca e já começava a prática de uma incipiente troca de sabão, velas e fumo.

O passo seguinte constituiu-se na formação do patrimônio religioso. Este se consistia na doação de terras à devoção do santo padroeiro, para a construção de uma capela. Em troca os doadores beneficiavam-se de favores espirituais para si e para os seus familiares, como a celebração de missas após suas mortes. Também, ganhava o reconhecimento da comunidade e o prestígio social e político.

Das terras doadas, uma parte poderia ser cedida a interessados para morar e trabalhar, mediante o pagamento de uma quantia fixa, paga anualmente para as despesas da igreja.

A capela construída passava a ser a referência de um arraial ou povoado, estimulando o início de uma aglomeração de casas de moradias e de negócios. Esse gesto de doação coube a Manoel Paes de Arruda e Manoel Affonso de Taborda, com a doação para o patrimônio de São João Batista de uma área de 400 braças de terreno em quadra.

A 10 de junho de 1827, o povoado foi elevado à categoria de Capela Curada e Padre Delfim nomeado o
seu cura. Em homenagem, no dia 24 de junho, dia de São João, celebrou-se uma missa, acompanhada de uma procissão em louvor ao santo padroeiro.

Em 1828, a imagem de São João Batista foi levada para a nova capela ainda inacabada e aí celebrada a festa do padroeiro. A mesma situava-se no meio do quarteirão da atual rua 7 com as avenidas 3 e 5. Ao seu redor surgiam casas de moradia e um incipiente comércio para atender às necessidades da população.

O Largo da Matriz tornou-se o centro do desenvolvimento do arraial. Com isso as pequenas casas de taipa, construídas às margens do Córrego da Servidão, vão permanecer distantes, e o local passou a
ser apenas uma passagem para as tropas de mulas, em direção ao sertão. Essa mudança atendeu as normas eclesiais que estipulavam que as igrejas deveriam ser construídas em lugares decentes, em sítios altos e livres de umidade. A região do Largo da Matriz atendia a essas especificações.

Na categoria de Capela Curada, o povoado teve seus juízes de paz escolhidos: o Capitão-Mor Estevam Cardoso de Negreiros, o Alferes Manoel Pais de Arruda e Manoel Afonso de Taborda. A eles cabia a manutenção da ordem e da segurança do núcleo urbano, consolidando assim a sua constituição jurídica e administrativa. Eram os chamados “homens bons” pertencentes à elite rural.

Em junho de 1831, a Guarda Nacional também começou a atuar junto à comunidade, constituindo-se
em uma força paramilitar visando à manutenção da ordem e da segurança, sob a autorização do juiz de paz.

A 17 de janeiro de 1832, o povoado foi elevado à freguesia ou Paróquia de São João do Rio Claro, atendendo as reivindicações da população. Ainda era uma pequena aglomeração, de aspecto simples, uma vez que habitado por pessoas de poucos recursos. As ruas já seguiam o traçado de tabuleiro de xadrez idealizado por Antonio Paes de Barros, sendo retas, bem alinhadas e cruzando-se em ângulo reto o que possibilitava a divisão de suas quadras em porções iguais. Estas apresentavam um aspecto uniforme, com suas residências geralmente de pau-a-pique, adobe ou taipa de pilão, construídas sobre o alinhamento das vias públicas. Os telhados, de uma ou duas águas, lançavam as águas das chuvas
sobre a rua e o quintal, facilitando a absorção da mesma pelo terreno. Imperava a rusticidade e a simplicidade nas construções.

Em 1832 foi fundada a Sociedade do Bem Comum, buscando estabelecer os objetivos da política local, administrar a venda das terras do patrimônio e organizar as atividades públicas, sociais e religiosas da freguesia, através da ação política dos grandes proprietários rurais. Ela exerceu o papel de governo provincial e municipal por cerca de sete anos, até 1839. Sua influência foi grande, determinando a organização do lugar. Porém, quando os seus interesses passaram a chocar-se com os do governo provincial que buscava nesse ínterim subtrair a autonomia das municipalidades, principalmente a competência jurídica dos juízes de paz, ela deixou de existir.

Assim achava-se organizada a freguesia de São João do Rio Claro até a década de 1830.

Caminhos que conduzem à vila e à cidade de São João do Rio Claro.

Na década de 1830, a cultura canavieira já havia sido implantada em São João do Rio Claro, utilizando técnicas rudimentares, e a mão-de-obra escrava, desde o plantio da cana até o trabalho no engenho.

Esta consolidou o domínio das grandes propriedades rurais na região. No entanto, o grande obstáculo para o aumento da produção da cana estava nas dificuldades com o escoamento da produção pois, a ligação entre a Freguesia de São João do Rio Claro e a capital da Província de São Paulo era muito precária.

As estradas que serviam a região haviam sido abertas por volta de 1823 e 1828, e não passavam de caminhos estreitos e difíceis de serem transpostos, principalmente em dias de chuva, constituindo-se em um grande obstáculo para o desenvolvimento do local.

Até então o transporte das mercadorias e do açúcar, era feito em lombo de burros. Troles puxados a bois ou burros, serviam para o transporte de pessoas, objetos diversos, maquinários, etc.

A comunicação entre a cidade de São Paulo e Vila Nova de Constituição, hoje a cidade de Piracicaba, era feita por uma pequena estrada carroçável que passava por Itu. Da Capital para São Carlos, hoje Campinas, havia uma estrada via Jundiaí.

Entre São João do Rio Claro e Tatuiby, hoje Limeira, havia uma pequena estrada com cerca de 4 léguas, feita por volta de 1823. Esta, apesar de sua precariedade, principalmente na época das chuvas, foi de extrema importância, para o escoamento da produção açucareira dos engenhos.

Para o desenvolvimento local era necessário que as estradas tivessem um traçado mais direto, encurtando as distâncias, objetivando a economia nos custos dos transportes, assim como evitando passar por Constituição para chegar a São Paulo.

A luta pela abertura desse caminho coube ao Senador Vergueiro, que liderou as iniciativas de lavradores e exportadores da região junto aos órgãos competentes, formulando pedidos e mostrando a real importância de uma estrada carroçável que atingisse São Carlos e São Paulo. Aos poucos começou a esboçar um projeto de construção de uma rede de comunicação entre as pequenas povoações que, embora precária, era importantíssima para estimular o desenvolvimento econômico da região.

A 7 de março de 1845, São João do Rio Claro tornou-se vila. A criação de uma vila estava condicionada à delimitação de uma área, para a constituição do município. O território da vila era chamado termo. Este por sua vez, era dividido em freguesias e englobava a área assistida pela igreja matriz, assim como outros arraiais.

O Município de São João do Rio Claro ficou com as seguintes divisas: ao norte com o município de São Carlos do Pinhal, Belém de Descalvado e Pirassununga; a leste com o Patrocínio das Araras; ao Sul com Limeira e São Pedro e a oeste com Brotas. Estas foram determinadas pela lei nº 48 de 14 de julho de 1848.

Encontramos no Almanack do Rio Claro de 1895, de autoria de Cândido das Neves, uma descrição do meio físico do município: “o terreno é desigual, elevado em alguns pontos pelo Morro Grande, ondulado e montanhoso. O município conta com diversos campos, entre eles os da Fazenda Angélica, o do Coxo e os de Itaquery, que são os mais extensos. A mais importante elevação do território é a da Serra de |Itaquery, que atravessa o município à oeste. Há também duas cadeias de montanhas, a do Morro Azul e do Morro Grande. Corta o município o rio Corumbataí, afluente da margem direita do Piracicaba e pelos ribeirões Claro, Cabeça e Passa Cinco, além de diversos córregos e riachos. Apresenta abundância de pedra calcária que fornece material a muitas fábricas de cal e, também, barro para olarias. Estes são usados por numerosas fábricas de telhas e tijolos”.

Como sede de um município São João do Rio Claro ainda era um pequeno aglomerado de casas em torno da igreja. Porém já começava a definir, como era comum a toda a vila, a localização da Casa da Câmara e da Cadeia, mostrando a necessidade da constituição de sua administração política.

Ao passar de freguesia a vila, também ganhou mais autonomia, com a instalação a 9 de novembro de 1845, da Câmara Municipal, sendo que as suas primeiras providências estavam voltadas para a organização do espaço urbano, sua constituição política e administrativa.

Entre as incumbências da Câmara Municipal estava o Registro de Casamento religioso de pessoas não católicas, residentes na cidade. Estes registros foram realizados entre 1864 a 1893. O primeiro registro foi do casamento de João Capretz e Madalena Knebliz em 18 de junho de 1864. Antes de a câmara assumir essa incumbência, o casamento de não católicos, era registrado no Tabelião da Vila de São João do Rio Claro.

A 30 de abril de 1857, a vila foi elevada a categoria de cidade pela Lei nº 44, atingindo dessa forma uma velha aspiração dos seus habitantes.

Gradativamente o urbano estruturava-se. A cidade já abrigava cerca de 2.500 pessoas. Já havia crescido em termos de expansão urbana, tendo o número de suas ruas aumentado.

Entre os anos de 1845 e 1864, o núcleo urbano era composto pelas: Ruas de São Benedito (hoje Rua 2); Rua das Flores (Rua 3); Rua do Campo (Rua 4); Rua das Formigas (Rua 5); Rua de São João (Rua 6); Rua da boa Vista (Rua 7); Rua Nova (Rua 8); Rua do Comércio (Avenida 1); Rua da Quitanda (Avenida 2); Rua Direita (Avenida 3); Rua Aurora (Avenida 4); Rua Alegre (Avenida 5); Rua 7 de Setembro (Avenida 6); Rua dos Ferradores (Avenida 8).

Essas ruas não eram calçadas e recebiam a denominação que a população naturalmente ia escolhendo, sempre tendo como referência a função que elas preenchiam, como por exemplo a Rua do Comércio, a Rua da Quitanda, etc.

A forma e a simplicidade adotada pela população local para dar nomes às ruas seguia um costume comum por todo o Brasil.

Espacialmente a cidade crescia e administrativamente ganhava complexidade. O café já começava a se constituir na grande riqueza do município de São João do Rio Claro.

Chega o “ouro verde”

O café passou a ser cultivado, na segunda metade do século XIX, sendo o responsável pelo desenvolvimento de São João do Rio Claro, tornando-o o terceiro município produtor de café da Província de São Paulo.

Produzia-se café para atender o mercado externo, sendo uma fonte geradora de lucros. Neste contexto atuaram inúmeros agentes, dentre eles, o grande proprietário rural, os negros escravos, o imigrante, e a ferrovia. O seu desenvolvimento gerou o crescimento do núcleo urbano, do comércio, e da pequena indústria manufatureira.

O cultivo do café aproveitou-se da infra-estrutura implantada pela cultura canavieira, assim como das condições ambientais da região, pois o Município apresentava solos férteis, um relevo suavemente ondulado, com baixa incidência de erosão e com uma temperatura com média anual de 20 graus, ideal ao seu plantio.

A cultura cafeeira gerou um processo de fragmentação dos antigos latifúndios canavieiros, resultando no aumento do número de propriedades rurais. Estas passaram de 56 para 152 unidades, entre os anos de 1859 a 1892.

A posse das terras foi dificultada ao imigrante, ao pequeno posseiro e ao pequeno agricultor. Coube à burguesia cafeeira local, a posse das mesmas. Os grandes fazendeiros, eram em sua grande maioria, descendentes das antigas famílias que povoaram a região: Camargo, Jordão, Nogueira, Penteado, Xavier de Negreiro, Paula Machado, e outros.

O café produzido em São João do Rio Claro era enviado a comissários em Santos. Estes eram os responsáveis pela venda do produto, aos exportadores de São Paulo e Rio de Janeiro. Destaque deve ser dado aos nomes de Nicolau Vergueiro e Manuel Rodrigues Jordão, dois dos maiores fazendeiros, comissários e exportadores de São João do Rio Claro.

O Almanaque de São João do Rio Claro para 1873, cita as seguintes casas de importação, exportação e comissões: a de Candido Valle & Irmãos; a de Guilherme Platt; a de Guimarães & Filho; a de Prado & Amarante; a de Santos & Cia. Esses, além de comerciantes desempenhavam também a função de agentes financiadores de capital para a lavoura cafeeira.

Quanto à organização, a lavoura cafeeira seguiu os moldes tradicionais da agricultura na Província de São Paulo ou seja, a grande propriedade rural, monocultora e trabalhada por escravos, mais tarde, substituídos pelo trabalhador imigrante. Todo o trabalho era manual. A mecanização só ocorreu a partir da década de 1870, com a introdução da máquina de beneficiar café, resultando no aumento da sua produtividade.

A lavoura cafeeira em São João do Rio Claro conviveu por quatro décadas com o trabalho escravo. Sem a sua utilização, ela não teria alcançado o seu apogeu. Mesmo com a proibição do tráfico, a partir de 1850, a oferta de mão-de-obra se manteve, através do tráfico interno que clandestinamente levava às regiões cafeeiras uma oferta abundante de mão-de-obra escrava.

Em 1884, havia na região, cerca de 4.980 escravos. Grande parte era procedente do Nordeste e do Rio de Janeiro. As vendas eram efetuadas pelas “cazas de compra” ou “escravadores” e registradas pelos cartórios locais. O preço variava entre um conto e trezentos mil réis para escravos jovens, inclusive crianças em torno de 10 anos de idade, a 500 mil réis para escravos acima de 40 anos de idade.

Os anos de 1887 e início de 1888, foram marcados por muitos conflitos entre escravos e proprietários. Fugas constantes e revoltas geraram tensões entre os fazendeiros, tornando difícil à manutenção do sistema escravista. Tentativas de libertação foram feitas, porém, o trabalho escravo continuou no município até a abolição total, com a Lei Áurea, em maio de 1888.

Somente na penúltima década do século XIX, os trabalhadores livres imigrantes, italianos e alemães começaram a integrar o processo de desenvolvimento de São João do Rio Claro, trabalhando tanto na lavoura cafeeira como em atividades urbanas, constituindo-se a partir de então, no sustentáculo do desenvolvimento local.

Muitos, mediante uma vida de luta, sacrifício e muito trabalho, tornaram-se pequenos proprietários rurais. Outros vieram para a cidade, em busca de novas oportunidades, desenvolvendo inúmeras atividades, como sapateiros, alfaiates, padeiros, marceneiros, caldeireiros, latoeiros, carpinteiros, etc., atendendo às necessidades da população que crescia. Também, desenvolveram ofícios e atividades industriais que até então eram desconhecidas, como por exemplo à indústria do laticínio, o cultivo de legumes e a apicultura.

Destacamos entre descendentes de imigrantes de origem germânica, os Helmeister, Hebling, Witzel, Fritz, Hilsdorf, Schimidt, Hartung, Schlittler, Hummel, Eichenberger, Hoffman, Muler, Lahr, Baungartner, Thielle, Barthmann, Fiedler, Hofling, Kleiner, Knudsen, Fisher, Kruegner, Lucke, Leonhart, Meyer, Naitzke, Oelhemeyer, Schneider, Stein, Spiller, Troppmair, Wiechmann, Winkel, Wehmut, Wenzel, etc.

Dos italianos, os Castellano, Giorgi, Piccoli, Codo, Venturoli, Zanardi, Cassavia, Padula, Timoni, Cerri, Coli, Muccillo, Aquino, Benetti, Bilac, Farani, Mazziotti, Minervino, Quilici, Mônaco, Pilla, Sciarra, Vecchiato, Fittipaldi, Scarpa, Fina, Gardenal, Santomauro, Perin, Pignataro, etc.

Também imigrantes portugueses, espanhóis, suíços, turcos, árabes, austríacos e outros aqui se instalaram, contribuindo sobremaneira para com o desenvolvimento local.

Integra também esse contexto, a chegada dos trilhos da ferrovia, a Companhia Paulista de Estrada de Ferro, popularmente conhecida como Paulista, em 11 de agosto de 1876.

A ferrovia facilitou o escoamento da produção cafeeira, cujas sacas até então eram transportadas em lombo de mulas. O transporte tornou-se muito mais rápido e racional, diminuindo os custos de sua produção.

Em 1892, foram instaladas as oficinas da Paulista, para consertos e reparos de trens e vagões. Elas aglutinaram uma série de atividades relacionadas à montagem, reparo, manutenção e até mesmo a produção de inúmeros componentes para as locomotivas, carros e os vagões, demandados pela ferrovia.

Além do mais, atuaram como difusoras do trabalho industrial na ferrovia, exigindo a formação de uma mão-de-obra especializada, vindo a influir significativamente no processo de valorização do trabalho ferroviário na cidade.

As atividades urbanas aumentaram e ganharam complexidade. O núcleo urbano cresceu, aumentando o número de quarteirões e já iniciando a formação de alguns bairros, principalmente a Vila Alemã.

Ao findar o século XIX, a cidade de São João do Rio Claro havia completado seu processo de formação político e econômico, vivendo do apogeu da produção cafeeira, cumprindo uma etapa dentro da longa jornada de sua formação.

O NÚCLEO URBANO DE SÃO JOÃO DO RIO CLARO: 1860 – 1890

A vida urbana de São João do Rio Claro, na década de 1860, já se encontrava organizada, porém ainda era uma extensão da vida rural. Essa situação foi se alterando com a chegada de imigrantes e mais tarde da ferrovia. Esses elementos podem ser considerados como os impulsionadores do desenvolvimento local, pois a cidade cresceu e ganhou importância, tornando-se o centro das atividades econômicas, em função do café.

Em maio de 1863, teve início a construção do Teatro São João, que foi aberto ao público em 20 de janeiro de 1864. Possuía 63 camarotes divididos em três níveis e uma platéia de 400 cadeiras. Foi um dos primeiros teatros da Província, apresentando ao longo de sua existência peças de grandes companhias teatrais nacionais e estrangeiras. Em1888, sofreu uma completa remodelação, passando a se chamar Teatro Phoenix. Situava-se na Rua Direita (hoje Rua 3), esquina da Rua do Comércio (hoje av.1).

Outra realização de destaque foi à construção do Gabinete de Leitura Rio-clarense, fundado em 23 de julho de 1876 e, em sede própria inaugurada em 1890, em uma solenidade presidida por Prudente de Morais, motivo de orgulho para São João do Rio Claro, por ter sido visitado pelo Imperador Pedro II, em 1886.

Na década de 1870 fundou-se a “Philarmônica Rio-clarense”, uma sociedade recreativa. Periodicamente realizava saraus dançantes, musicais e literários, com a exibição dos melhores e mais reputados artistas da música e da oratória. Era o local de reunião e encontro da sociedade rio-clarense.

O perímetro urbano de São João do Rio Claro, em 1867, compreendia 40 quarteirões, delimitados entre a Rua do Hospital (Av. 7) e a Rua Paissandu (av.12), com a Rua da Palma (Rua 9) e a Rua de São Benedito (Rua 2). Já havia sido construída a Capela de Santa Cruz, tendo sido benzida e entregue aos devotos, em abril de 1857. Já estava em funcionamento o Hotel do Oeste, na Rua Municipal (Av. 2) com Rua São João (Rua 6) , O mesmo recebia um número significativo de pessoas que buscavam a cidade para a realização de seus negócios.

Na década de 1870, a cidade já era servida por uma agência do correio na Rua Formosa (Rua 4) com Rua do Comércio (Av. 1) . A Praça do Mercado situava-se no Largo da Matriz Nova, sendo seu administrador o sr. Luiz Braz de Pinna.

Em 1873, foi fundada a escola protestante – Colégio Americano - pelo Reverendo João Fernandes da Gama, e em 1877 começou a funcionar o Colégio Santa Cruz, na Rua Aurora (Av. 4), dirigido pelo Capitão-Mor Carlos da Silva de Araújo. Dyonísio Caio da Fonseca fundou o Colégio Esperança, na Rua de São João (Rua 6). Em 1883 o Prof. Theodor Koelle deu início às aulas da Escola Alemã, hoje Ginásio Koelle. Nesse momento, a cidade já contava com uma orquestra sendo seu Diretor José Bento Barreto.

O comércio local ampliava, contando nesse momento com lojas de fazendas, armazéns de molhados, louças e gêneros da terra, depósitos de cal, de farinha de trigo, de sal, de madeira, de calçados, de correias para máquinas em geral e, de mercadorias importadas, que funcionavam anexas às casas de importação e exportação.

Ao iniciar a década de 1880, o perímetro urbano foi acrescido das ruas Dr. César (Rua1), e a Rua Pedro Ivo (Rua 10), significando o início da formação do atual bairro da Boa Morte. Em 1886, os nomes das ruas foram substituídos por números, de acordo com resolução da Câmara Municipal.

O urbano crescia e em conseqüência do aumento das atividades comerciais, decidiu-se em 1895, construir uma nova praça para o mercado. Esta se situava em um terreno nas Ruas 8 e 9, com a Avenida 6. O mesmo foi inaugurado em 1897.

Até então, a iluminação em São João do Rio Claro era feita com lampiões de querosene, colocados em postes, somente nas esquinas, deixando as ruas às escuras, pois o raio de iluminação desses lampiões não ultrapassava 10 metros ao seu redor. Em função disto, a Câmara Municipal assinou em 1884, contrato com a firma Real e Portella, para a instalação da luz elétrica, tornando São João do Rio Claro a primeira cidade da Província de São Paulo e a segunda do Império a possuir luz elétrica em suas ruas. A sua inauguração ocorreu em 7 de setembro de 1885.

A fonte geradora de energia da firma Real e Portella, ficava instalada no centro da cidade, na esquina da Rua7 com a Avenida 2. Mais tarde em 1891, passou para a Companhia Mechanica Industrial Rio-clarense, resultando na construção da Usina de Corumbataí. Esta foi inaugurada em 15 de novembro de 1895, e representou o pioneirismo dos empresários locais.

Outra preocupação constante dos administradores locais era a questão do abastecimento de água. O primeiro contrato foi celebrado em 11 de novembro de 1884, para abastecer a cidade com duzentos e vinte mil litros de água, diariamente. Estas seriam tiradas do Córrego da Servidão e distribuídas à cidade por meio de torneirões que foram instalados em pontos estratégicos da cidade.

Nesse momento, já estão presentes na paisagem urbana inúmeros casarões dos barões de café. Eram residências maiores, apresentando suas fachadas ornadas com florões, estátuas e vasos colocados nos beirais. Algumas residências possuíam alpendres que serviam como peça de receber, geralmente ficava junto a um jardim, tornando-se um lugar muito agradável.

Outros elementos decorativos das fachadas eram os janelões com vidros decorados, as platibandas de cerâmica, os revestimentos de azulejos portugueses e muitos florões. Estes só puderam ser utilizados após a substituição da “taipa de pilão”, pelo tijolo, facilitando a sua colocação. Outro elemento decorativo importante foi à bandeira de vidro e de grade de ferro, facilitando a iluminação interna, visível na maioria dos casarões de São João do Rio Claro.

Ao findar o século XIX, São João do Rio Claro expandia-se e o núcleo urbano aumentava, estendendo-se para além da estação ferroviária. Já surgiam novos bairros, como a vila Alemã e a Cidade Nova.

A cidade tornava-se centro regional do comércio e o café representava a sua maior riqueza. Já se esboçava o início de um processo de industrialização, através da instalação de um número significativo de pequenas fábricas manufatureiras artesanais, empregando na maioria das vezes a mão-de-obra da própria família e gerando um infindável número de produtos, consumidos pela população. Essas atividades foram geralmente implementadas pelos imigrantes já familiarizados com o trabalho artesanal no seu país de origem.

Esta trajetória vem nos mostrar um pouco do longo caminho percorrido pela nossa cidade, em busca da realização dos ideais de homens e mulheres que, com seu trabalho, sua vida, amor e dedicação idealizaram e construíram um lugar chamado São João do Rio Claro, hoje simplesmente Rio Claro.

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

GARCIA, L. B. R. São João do Rio Claro - Aventura da colonização. Rio Claro: IGCE-UNESP. 2001. Tese de Livre Docência.

 

Desenvolvimento: Centro de Análise e Planejamento Ambiental- CEAPLA/IGCE/UNESP

Apoio: FAPESPFundação de Amparo à Pesquisa