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Abelhas Brasileiras Sistemática e Identificação

Fernando A. Silveira, Gabriel A. R. Melo, Eduardo A. B. Almeida

Livro de autoria de Fernando A. Silveira, Gabriel A. R. de Mello, 2002, 253 pp. Belo Horizonte.

Propósito
As abelhas são dos organismos mais bem estudados no Brasil; nosso país abriga um grande contingente de pesquisadores, vários deles internacionalmente reconhecidos, que estudam os mais variados aspectos da biologia desses insetos: comportamento social, biologia de nidificação, fisiologia, morfologia, genética, ecologia, manejo, sistemática. Este fato, entretanto, está longe de significar que o conhecimento sobre nossas abelhas seja grande – há muito, muito, por ser descoberto.
Nós, autores deste livro, representamos as duas mais novas gerações de melitólogos brasileiros: aquela que acabou de se formar e se instalar em nossas universidades e aquela que ainda está se formando nos cursos de pós-graduação. Por isso, tomar para nós a tarefa de escrever esta obra pode parecer uma decisão pretensiosa – e talvez seja. Entretanto, foi das nossas limitações como novos pesquisadores que se originou este livro: do esforço que fazíamos para juntar, atualizar, adaptar e, freqüentemente, traduzir as chaves de identificação dispersas na literatura para nosso próprio uso; do trabalho de catalogação das espécies de ocorrência constatada no Brasil e sua distribuição geográfica, para embasar as discussões dos resultados de nossos projetos de pesquisa; do esforço de entender os vários sistemas classificatórios, freqüentemente contraditórios, propostos para as abelhas e o relacionamento entre os vários táxons. À medida em que este trabalho foi ganhando corpo e que outros estudantes e pesquisadores de nosso círculo mais próximo foram tomando conhecimento de sua existência e utilizando o nosso material improvisado, foi ficando evidente que ele poderia ser útil a um público bem mais amplo, além das paredes de nossos laboratórios e dos laboratórios de nossos amigos mais próximos.
Obviamente, pouco do que se encontra nas páginas que se seguem é contribuição original; nosso objetivo foi principalmente o de compilar o vasto conhecimento produzido pelas gerações de pesquisadores que nos antecederam e colocá-lo à disposição daqueles que, como nós mesmos, lutam para compreender melhor a sistemática de nossas abelhas.
Por outro lado, a edição deste livro pode parecer supérflua, dada a recente publicação da obra monumental de Charles D. Michener, “The Bees of the World”. Realmente, o trabalho de Michener será referência obrigatória para os melitólogos de todo o mundo por décadas (a exemplo de seu trabalho de 1944, “Comparative external morphology, phylogeny, and a classification of the bees”). Entretanto, alguns fatores nos encorajaram a dar continuidade ao nosso projeto:
1) Por tratar de toda a fauna mundial de abelhas e por ser uma obra publicada no exterior, o livro de Michener é muito grande e caro. Devido a seu preço e à barreira representada pela língua inglesa, prevemos que ele estará inacessível para muitos daqueles que potencialmente poderiam vir a precisar dele no Brasil.
2) Reduzindo a abrangência geográfica ao Brasil e, portanto, reduzindo o número de táxons discutidos, as chaves de identificação puderam ser simplificadas, tornando-as de uso mais fácil. Aliás, isto é notado pelo próprio Michener em seu livro (pg. 115).
3) A classificação adotada por Michener para vários dos grupos de abelhas representados no Brasil não corresponde àquela tradicionalmente utilizada em nosso país e/ou àquela que julgamos mais adequada. Algumas dessas diferenças dizem respeito à adoção de diferentes princípios classificatórios: enquanto Michener (e outros melitólogos) admite a formação de táxons parafiléticos, nós preferimos adotar apenas táxons monofiléticos (holofiléticos). O número de táxons afetado por essa diferença de princípios, entretanto, não é muito grande, em decorrência da própria falta de informações sobre a filogenia dos vários grupos de abelhas.
4) Além disto, sempre que em dúvida sobre os limites de determinados grupos aparentemente interrelacionados, Michener adota a postura de juntá-los todos em um único táxon, para enfatizar as suas prováveis afinidades. Como faltam estudos sobre a filogenia da grande maioria dos grupos de abelhas, nós adotamos a postura contrária: quando em dúvida, preferimos manter os grupos separados, para evitar a possibilidade de misturar, em um único táxon, representantes de linhagens não relacionadas. Como conseqüência, nossa classificação (principalmente no nível genérico) freqüentemente vai se parecer mais com as de outros autores brasileiros, como Jesus S. Moure e Danúncia Urban, que tendem a reconhecer grupos menores.
5) Por outro lado, em sua maior parte, as diferenças entre os esquemas classificatórios que apresentamos aqui e aqueles utilizados por Michener devem-se apenas à colocação dos mesmos grupos em diferentes níveis da hierarquia lineana. Como o próprio Michener enfatiza em diversas passagens de seu livro, essas diferenças devem-se a decisões subjetivas em que não há posição correta ou errada. Um excelente exemplo destas diferenças é a classificação dos gêneros de nossas “abelhas indígenas sem ferrão”: muitos dos grupos que, no Brasil, costumamos tratar como gêneros – seguindo a opinião de taxônomos como o padre Jesus Santiago Moure e o professor João Maria Franco de Camargo – são considerados como subgêneros por Michener. Assim, por exemplo, Geotrigona, Tetragona e Tetragonisca são considerados, por ele, com subgêneros de Trigona.
Independentemente de todos os aspectos abordados acima, com a intensificação dos estudos sobre a filogenia dos diversos grupos de abelhas, é de se esperar que mudanças (algumas das quais possivelmente profundas) ocorram nos esquemas classificatórios em uso atualmente.
Temos consciência de que o resultado final de nosso trabalho conterá muitas falhas; talvez muito mais do que nossos leitores estejam dispostos a tolerar e perdoar. Esperamos, contudo, que ele contribua para facilitar à nossa comunidade de melitólogos a continuidade e aprofundamento de seus estudos. Muito nos alegrará, também, se este livro contribuir para despertar o interesse de novos cientistas brasileiros pelos maravilhosos organismos que são as abelhas.

 

 

Desenvolvimento: Centro de Análise e Planejamento Ambiental- CEAPLA/IGCE/UNESP

Apoio: FAPESPFundação de Amparo à Pesquisa