A história do uso de animais para fins didáticos é algo que acompanha
a ciência desde aproximadamente 1550 a.C. até a atualidade. Durante o desenvolvimento
do pensamento científico, Renée Descartes, filósofo francês da Renascença,
afirmava que os animais não tinham alma, por isso não sentiam dor e eram
utilizados de maneira, muitas vezes, irresponsável. A partir do século
XIX, surgiram os primeiros grupos que contestavam o uso dos animais pela
ciência, movidos pelo sentimentalismo. Desde então, fez-se necessária a
criação de uma legislação que regulamentasse a sua utilização. No Brasil,
a legislação vigente corresponde à "Lei Arouca", criada somente em 2008,
que foi um grande avanço para o Direito Animal. Além disso, houve também
o surgimento de Códigos de Proteção Animal, que restringem e fornecem alternativas
para a prática com animais, no ensino superior.
Atualmente, os cursos relacionados à área biológica se utilizam
de animais nas disciplinas de fisiologia, anatomia e técnicas cirúrgicas,
principalmente. A metodologia com animais envolve a vivissecção (literalmente,
"cortar" um animal vivo, anestesiado ou não), a dissecação (separar partes
do corpo ou órgãos de animais mortos para estudar sua anatomia), a observação
do comportamento animal, entre outros, para complementar a teoria apresentada
em sala de aula. Os profissionais que utilizam os animais para fins didáticos
alegam que o funcionamento, a estrutura e a coloração do organismo animal
e humano são semelhantes. Além disso, o estudante aprende a lidar com imprevistos
e a ter responsabilidade perante a vida. As práticas são realizadas de
acordo com as leis da bioética.
Por outro lado, existem alternativas tão eficazes quanto a utilização
animal em sala de aula, que envolvem modelos computadorizados que simulam
a realidade virtual, manequins, vídeos interativos, autoexperimentação,
estudos in vitro (ou seja, em ambiente controlado, fora de sistemas vivos)
e estudos de campo. Existe também a possibilidade de criarem-se convênios
com abrigos ou clínicas e hospitais veterinários que doem animais mortos
naturalmente ou que possam ser submetidos a cirurgias de castração, sendo
possível posteriormente a doação. A prática, com não apenas um, mas vários
métodos substitutivos, oferece vantagens como a realização das atividades
no ritmo do aluno, podendo haver repetições e variações, o que não é possível
nas aulas tradicionais.
Segundo estudos realizados por diversos grupos, o custo da implementação
de alternativas pode ser alto em curto prazo, mas em longo prazo este gasto
é recuperado. Ao passo que o custo com a manutenção de biotérios pode ser
significativo, ao longo do tempo. A aquisição de equipamentos para manutenção
de animais em biotérios é de, aproximadamente, U$ 7.000,00, em comparação
à compra de métodos alternativos, que pode ter preços variados. Por exemplo,
a UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul) adquiriu um sistema
de simuladores plásticos que custou em torno de R$ 300.000,00.
Ao mesmo tempo que a prática com animais pode significar um distanciamento
necessário do profissional em relação ao seu objeto de estudo, a vida,
também pode ocasionar a dessensibilização do aluno. Neste caso, a utilização
de animais como um instrumento seria um desrespeito à vida, sendo contrário
aos princípios éticos das profissões que a estudam.
A oposição existe também no campo filosófico. A utilização animal
para fins didáticos pode ser vista como um utensílio para aprender a salvar
a vida de outros animais e pessoas, posteriormente. Do lado oposto, esta
ação é considerada fruto do pensamento de que o homem é superior aos demais
seres vivos (antropocentrismo), podendo usufruir de outra vida em prol
dos seus próprios objetivos, o que seria antiético.
As aulas que se utilizam de animais são tradicionalmente aceitas e,
talvez por isso, apresentam maior praticidade em sua elaboração. Entretanto,
isso pode representar um comodismo por parte dos professores, pois, tal
como diz Roberto Sogayar, professor aposentando do Instituto de Biociências,
em Botucatu, "Alguns professores reclamam das instruções das simulações
estarem em inglês".
No exterior, observa-se a crescente utilização de métodos de substituição,
sendo que 71% das universidades dos Estados Unidos utilizam-se destes
métodos, assim como 28 universidades italianas e todas as universidades
da Inglaterra e da Alemanha. No ensino superior brasileiro, no entanto,
a maioria das universidades mantém os métodos tradicionais. Algumas das
entidades que utilizam métodos substitutivos ao ensino com animais, além
da UFRGS, são a Faculdade de Medicina e Veterinária da USP, Universidade
Federal de São Paulo (UNIFESP) e Universidade Federal de Pelotas (UFPEL).
Em razão deste quadro, pesquisas foram realizadas, como pela aluna Carolina
Barbudo na Universidade Federal de Alfenas (UNIFAL), com intuito de
saber a opinião de estudantes e professores a respeito do tema. Os dados
mostraram que 75% dos estudantes não concordam com o uso de animais quando
alternativas podem ser aplicadas, e quase metade dos estudantes já se sentiram
mal ou incomodados com o uso de animais em aulas práticas. A pesquisa também
apontou que 50% dos professores raramente se interessam pela opinião dos
estudantes em relação a estas aulas, o que se torna um fato relevante,
tendo em vista que o Código de Proteção ao Animal do Estado de São Paulo
garante o direito à objeção de consciência (que é o direito de ser contra
qualquer ato de violência a todos os seres viventes, seja por motivo religioso,
filosófico ou por liberdade de pensamento) e exige a previsão de métodos
alternativos à experimentação didática em animais na programação da disciplina.
Portanto, a universidade deve sempre procurar informar aos estudantes
sobre seus direitos e os métodos utilizados, promovendo debates e
discussões sempre que possível. Caso apresentem objeção de consciência,
a universidade tem o dever de conceder-lhes espaço e de fornecer-lhes um
método alternativo de aprendizado. Considerando os diferentes posicionamentos
frente a este tema, deve ser adotada uma postura parcimoniosa por parte
das universidades, ou seja, que equilibre as diferentes opiniões, tratando
todas as formas de vida, e em suas diferentes manifestações, de maneira
respeitosa.