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ARTIGOS: Divulgação Científica




Do elefante ao tamanduá: a divulgação da fauna brasileira para crianças

Graziele Scalfi, bióloga e mestre em Divulgação Científica e Cultural; LABJOR - Unicamp

Você já perguntou para uma criança qual seu animal favorito? Se sim, tente recordar sua resposta. Lembrou? Não? Então pergunte, ainda há tempo! A probabilidade dela citar nomes de animais exóticos, como elefante, girafa, gorila, hipopótamo, canguru e urso polar, cuja distribuição geográfica não inclui o território brasileiro, em detrimento de animais silvestres nativos, como jupará, anta, gato-mourisco, entre outros, é bem grande. E por que isso acontece?

Não há uma resposta única e exata, porém é possível levantar algumas hipóteses que contribuem para que isso ocorra. Uma delas está relacionada à forte influência da mídia, com a veiculação de desenhos animados, filmes, jogos e livros infantis que, frequentemente, destacam os grandes mamíferos, sobretudo, os africanos. Filmes como “Madagascar”, “O rei leão” e “Os sem floresta” são exemplos disso. Outra hipótese está relacionada ao fato de que estes animais são mais impressionantes do ponto de vista físico, com maior poder de encantamento sobre as crianças. Adicionalmente, também é preciso destacar que é incipiente o trabalho de divulgação científica sobre os animais da fauna nacional.

O Brasil é um dos países com maior diversidade biológica do planeta e, ainda assim, a fauna e a flora nativas são pouco conhecidas pela população local. Pensando nisso, parte da pesquisa de mestrado da aluna Graziele Scalfi foi desenvolvidacom crianças da educação infantil do Centro de Convivência Infantil (CECI) da Unicamp, para verificar a potencialidade de um livro interativo sobre os mamíferos brasileiros, chamado “Mami o quê?”, por meio de diferentes estratégias, como jogos, dramatização, estudo do meio, desenhos e momentos de curiosidades.

Essas atividades, que foram desenvolvidas com 73 crianças de 3 a 6 anos de quatro turmas diferentes, tiveram o livro “Mami o quê?” como instigador e foram realizadas de acordo com o planejamento e proposta de trabalho já existente de cada professora. Por exemplo, se a leitura era uma prática da professora, o livro “Mami o que?” foi inserido como umadas opções. Para complementar, uma dramatização com a utilização de máscaras de animais e silvestres nativos e exóticos foi realizada.

Na execução da atividade de leitura e dramatização, um fato interessante constatado foi em relação à resistência dos alunos emtrabalhar os animais brasileiros. Durante a leitura, por exemplo, uma criança questionou a falta dos animais exóticos no texto: “E o tigre?”, perguntou Isaac de 4 anos. A professora, então, logo avisou que as crianças estavam esperando por bichos que não iriam encontrar no livro, porque era um livro sobre os animais brasileiros. O mesmo ocorreu durante a dramatização. Quando oferecidas fantasias de animais exóticos e nativos, os três primeiros animais a serem escolhidos foram: leão, girafa e tigre. Segundo a pesquisadora, esta resistência aos animais brasileiros pode ter relação com o fato das crianças desconhecerem grande parte dos animais apresentados no livro. Ao dizer os nomes dos animais para as crianças, como anta, mão-pelada, ouriço, entre outros, em muitos momentos elas comentavam entre elas: “Credo”, “que feio”, “que bicho esquisito”, “eu nunca vi”.

O desconhecimento da fauna brasileira também foi notado nos desenhos realizados em uma outra turma, para entender e verificar como os animais exóticos estavam imersos no cotidiano das crianças e quais eram suas ideias prévias sobre os animais brasileiros. Dos 16 alunos que participaram, apenas um desenhou um animal da fauna nacional: a onça-pintada, feita pelo João, de 5 anos.

Posteriormente, após as atividades desenvolvidas com a turma, como o stop motion, a visita ao zoológico e os momentos de curiosidades, a situação foi revertida. A partir de então, os animais brasileiros passaram a figurar nas escolhas destas crianças (em todos os desenhos), demonstrando que é preciso incentivos para que se façam presentes no cotidiano delas.

A pesquisadora ressalta que o livro sozinho não promove mudanças intensas e profundas. São as práticas e atividades propostas, tendo como referência o livro, que acrescentaram informações, curiosidades e fantasia ao mundo destas crianças. Quando elas foram apresentadas aos animais brasileiros que desconheciam, através de diferentes propostas (contação de história, dramatização, stop motion, desenhos etc.), quiseram saber cada vez mais, aguçando a curiosidade. Este pode ter sido o início de um encantamento que trará bons frutos, não apenas no âmbito pessoal de conhecimento e aprendizado, mas também em relação à divulgação e conscientização sobre estes animais.

Quando há um desconhecimento da fauna nacional por parte das crianças, a preservação e conservação destas espécies se torna um desafio, porque existe uma dificuldade em preservar aquilo que é desconhecido. Logo, atividades como estas, que buscam divulgar a ciência nas séries iniciais, são essenciais, uma vez que estas experiências sensibilizam para o saber científico e reforçam a riqueza da fauna nacional.

E você, conhece o jupará, o mão-pelada e o gato-maracajá?







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