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ARTIGOS: Alimentação




Você já ouviu falar em irradiação de alimentos?

A irradiação é um processo físico que consiste na aplicação de radiações ionizantes emitidas de elétrons de alta energia (elétrons acelerados), de raios-X ou mesmo de isótopos radioativos, cujas energias são satisfatoriamente capazes de ionizar outros átomos e moléculas. Dos isótopos radioativos podemos citar o Césio-137, lamentavelmente popularizado através do acidente radiológico de 1987 (ocorrido em Goiânia, Goiás), e o Cobalto-60, amplamente utilizado como fonte de irradiação de diversos alimentos, tanto de origem vegetal (sobretudo frutas) como animal (carnes de diversas origens). Certas intensidades radiológicas auxiliam, por exemplo, no transporte, na venda e, consequentemente, no consumo dos alimentos, pois elas, quando em doses adequadas, eliminam os microrganismos responsáveis pelo processo de amadurecimento/deterioração dos alimentos, deixando-os viáveis por mais tempo. Esses microrganismos estão representados em sua maior parte por alguns grupos de bactérias e fungos, assim, conhecer o comportamento desses grupos frente às irradiações é também conhecer melhor aspectos da biologia desses organismos – uma vez que os seres vivos já se encontram “atravessados” constantemente por inúmeras e naturais radiações de diferentes origens e intensidades (a solar, por exemplo), como se comportariam frente a exposições radiológicas de maiores intensidades? Essa é uma típica pergunta que vários cientistas da área fazem para diversos organismos em diferentes alimentos.

A história da radiação (entendida como parte da “história da energia nuclear”) é, até o presente momento, a última peça colocada pela Química e pela Física ao desenvolvimento de suas respectivas Histórias – o homem aprendeu a dominar o fogo, a mecânica clássica, o petróleo e a eletricidade... a energia! Conhecendo-a melhor, descobriu o átomo, sua composição e foi capaz de desenvolver e utilizar suas propriedades: dentre os usos pacíficos, podemos citar, para além da irradiação de alimentos, a produção de geradores de potência e reatores (para fornecimento de energia elétrica), a realização de tratamentos de doenças e a obtenção de diagnósticos, análises químicas de solo, dessalinização da água, controle entomológico, dentre outros. Entretanto, para fins não pacíficos (leia-se “bélicos”) o homem desenvolveu a bomba atômica, da histórica tragédia de Hiroshima e Nagasaki, Japão.

Retornando à questão da irradiação de alimentos, temos que os primeiros estudos e experimentos nacionais foram realizados no Centro de Energia Nuclear na Agricultura (CENA) / USP, localizado em Piracicaba, interior do estado de São Paulo, na década de 50, quando, ainda por falta de políticas nacionais voltadas ao consumo de alimentos irradiados, a prática dessa irradiação para fins comerciais não podia ocorrer. Assim, os experimentos e os respectivos conhecimentos adquiridos ficaram restritos ao âmbito laboratorial. Somente a partir de 2001, com a Resolução 21 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), foi possível estabelecer critérios de segurança tanto para a irradiação de alimentos como para a produção em larga escala (comercial) dos mesmos. A fonte da radiação de Cobalto-60 é a mais segura, tanto questão da relação custo-benefício como pela propriedade isotópica “forma metálica insolúvel em água”, o que evidencia uma preocupação ambiental. A insolubilidade do Cobalto-60 assegura que o mesmo não seja dissipado pelos cursos d´água, o que viria a contaminar cadeias alimentares, áreas agrícolas e até mesmo a captação e abastecimento urbano de água. Entretanto, é preciso salientar que tanto o Cobalto-60 como outras fontes radioativas, quando em desuso, devem ser mantidos em containers apropriados para descarte de lixo radioativo.

Embora se trate de uma maneira de conservar alimentos, é interessante frisar dois aspectos da irradiação de alimentos: a) cada alimento-tipo possui um tempo específico para receber uma também específica intensidade de radiação, sem que suas propriedades nutricionais e demais aspectos como cor, sabor e textura sejam afetados b) a irradiação dos alimentos não resolve o problema do desperdício alimentar, visto que tal situação se encontra mais atrelada às maneiras irregulares de armazenamento desses produtos e ao consumo não consciente. Outro ponto importante de ser salientado é que, mesmo após a criação das instruções regulamentares da irradiação de alimentos, os consumidores ainda estão pouco informados a respeito de quais alimentos são alimentos irradiados. Partindo de um histórico promissor da irradiação/radiação nuclear, é ainda preciso levar esta temática para próximo das pessoas: é preciso e possível, por exemplo, promover discussões em workshops de ciências aplicadas, bem como campanhas acerca de quais alimentos ingeridos contém partes/componentes irradiados. Só assim, a conscientização promoverá a dissipação do aspecto sombrio/perigoso no qual a temática radiação se apresenta, sem descartar seus cuidados necessários.

Quer saber mais?

BRASIL. Agência Nacional de Vigilância Sanitária - ANVISA. Resolução nº 21, de 26 janeiro 2001. Disponível em: . Acesso em: 11 abr. 2015.

SILVA, K.D.; BRAGA, V. de O.; QUINTAES, K.D.; HAJ-ISA, N.M.A.; NASCIMENTO, E.S. Conhecimento e atitudes sobre alimentos irradiados de nutricionistas que atuam na docência. Ciência e Tecnologia de Alimentos, v.30, n.3. 2010.

TRINTA anos em CENA. Regina Machado Leão (org). São Paulo: Ed. da Univ. de São Paulo, 1997.

Artur Rodrigues Janeiro







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